terça-feira, 18 de janeiro de 2011

COMEÇARAM OS ESTADUAIS, AS FÓRMULAS AINDA FUNCIONAM?

Começou neste fim de semana os campeonatos estaduais, grande coração do futebol brasileiro, e, como muita gente gosta de frisar, onde realmente encontramos o charme do esporte nacional.
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Mas com o crescente profissionalismo e o aumento de dinheiro envolvido nos campeonatos, fica cada vez mais difícil para um time “pequeno” (leia-se, pobre) competir com um “grande” (leia-se, rico). Dificilmente veremos a Portuguesa-SP ter o mesmo brilho da época de Djalma Santos, por exemplo, ou os Américas (de RJ e de MG) figurarem novamente entre as elites estaduais.
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Neste caminho, muitos cronistas esportivos questionam a validade de uma competição de nível tão pífio no futebol nacional, outros até já fazem deboche. Como amante inveterado dos estaduais, acho-os NECESSÁRIOS num país CONTINENTAL como o Brasil – afinal, que grandes atrativos tem um Campeonato Brasileiro que dure 1 ano inteiro para os expectadores, por exemplo da Paraíba ou de Roraima, cujos clubes não estão nem na 2º divisão, e mais importante ainda, como os jovens destes estados mais pobres da federação terão chances no futebol, pois imaginamos que num país tão imenso e tão amante da bola geraria craques de bola espalhados pelos seus quatro cantos da –, todavia eu acredite que o modelo encontra-se, há muito, atrasado e falho.
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Uma mudança no calendário nacional de futebol faz-se, a partir destas premissas, urgente. Como crítico deste modelo aí vigente, venho também propor certas mudanças na sua organização.
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Meu primeiro movimento seria modificar os estaduais, sobretudo dos grandes centros – isto é, onde encontramos mais times na elite do futebol, as 1º e 2º divisões –. Tomaremos como exemplo o campeonato carioca – só pelo fato de ser o meu preferido –: Qual a necessidade do Botafogo, do Vasco, do Fluminense e do Flamengo jogarem sete ou oito jogos para irem para os mata-matas, quando já especulamos, pelas leis das probabilidades, que eles irão?
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Na minha opinião, para aumentar a competitividade, a fase de grupos deveria ser disputada pelos clubes de menores orçamentos, os chamados “pequenos”. Estes pequenos, então, poderiam disputar 4 vagas para as 8º de final, cada um pegando um grande, depois em cruzamento direto até que sobrem 2 para as finais. Os grandes, por sua vez, se enfrentariam, nas prováveis semi e finais, mas num sentimento de urgência, em que perder para um rival equivaleria a perder um título.
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Vejamos, como contraponto, o que ocorreu no Cariocão-10, o BFR perdeu para o Vasco na Taça Guanabara (doravante TG) e para o Fluminense na Taça Rio (TR), o que não mudou em nada o fato do Botafogo ter se tornado campeão direto vencendo os dois turnos, sendo o único dos grandes com 100% de aproveitamento sobre os pequenos; e nós sabemos que um simples empate no mata-mata pode virar a loteria dos pênaltis, uma ameaça séria ao elenco superior e mais caro de um time grande, ao contrário, nos pontos corridos, beneficiaria aqueles times com maior poder de fogo.
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Doutra forma, os pequenos poderiam aprontar contra os grandes. No modelo atual, um pequeno acaba tendo interferência apenas nos primeiros jogos; quando os grandes pegam ritmo, os embates contra os pequenos viram jogo treino. No entanto, o histórico recente mostra que pequenos podem sim aprontar nestes mata-matas, como em 2006, por exemplo, ou nas semifinais do Paulistão de 2010.
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O mesmo aplicar-se-ia a outros grandes centros, mormente São Paulo, onde a fórmula poderia ser a mesmíssima (contando 4 grandes), além de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e Paraná (cada um destes estados contando com 2 grandes times, com títulos nacionais). Estes 5 estados detém quase toda a totalidade dos títulos nacionais, ficando apenas 3 títulos no Nordeste: 2 do Bahia e 1 do Sport de Recife. Estes times grandes podem ser aproveitados em torneios mais curtos e mais rentáveis, como logo discutiremos.
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Obviamente há defeitos neste modelo sugerido, claro, e o mais nítido: uma possível queda de arrecadação, proveniente de um grande esvaziamento dos estádios. Mas tirando os jogos dos grandes contra os pequenos, e os clássicos que por ventura aparecem, quando é que vemos os estádios com bom público, sem ressaltar o fato de quase todos os jogos já serem entre pequenos? O que num primeiro momento seria o esvaziamento dos estádios, pode acarretar num movimento oposto, sem a influência dos grandes e com os pequenos tendo chances, a briga seria maior entre eles, aumentando a competitividade, e consequentemente a qualidade e com ela, público. O que ocorrerá, com certeza, é a supervalorização dos clássicos: com a sensação de urgência, de vencer ou vencer, a rivalidade só aumentará.
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Outro caráter questionável seria a perda de fórmulas consagradas. Por exemplo, no Rio de Janeiro existe as duas taças que o campeão de cada turno levanta, e guarda em casa, troféus que podem ser a glória máxima de um pequeno, mas não muito para um grande – fórmula que me parece ter sido adotada também no Rio Grande do Sul –. Nada impede, no entanto, que se disputem as duas taças, os dois turnos, aumentando os jogos – e com isso a arrecadação – dos pequenos, os grandes sempre entrando nos mata-matas, com sorteio direcionado, por exemplo: Se na TG numa chave caíram Botafogo e Fluminense e na outra Vasco e Flamengo, projetando um clássico VOVÔ e um dos MILHÕES para as semi; na TR o sorteio inverteria os chaveamentos, daí se o Vasco fosse o sorteado, só não poderia cair na chave dele o Flamengo, que sendo este sorteado, iria imediatamente para o outro agrupamento.
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Valorização dos clássicos, jogos em que os pequenos poderiam surpreender, estádios mais cheios para os jogos decisivos, arrecadação, arrecadação... É claro que a estratégia de dois turnos geraria mais dividendos só pelo motivo de ter mais clássicos, mas abriria espaço para mais crítica, como o inegável questionamento: o que os grandes fariam entre as fases finais dos estaduais? Minha resposta: LIGAS REGIONAIS.
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Como Nordestino sei a importância e o sucesso da copa do Nordeste (a partir de agora, CNE), torneio de grande força e valor no início da década passada, mas retomado meio que aos trancos e barrancos ano passado, muito mais pelo calendário deficitário causado pela copa do mundo e pelas várias divisões do Campeonato Brasileiro (CBR). E se pudemos utilizar os estaduais alimentando-se das rivalidades locais, há também as rivalidades regionais. O Torneio Rio-São Paulo (RSP), por exemplo, move verdadeiras paixões, e possíveis disputas de marketing: quem tem mais torcida: Flamengo ou Coríntians? Qual o time que teve mais gênios do futebol de todos os tempos: o Santos de Pelé ou o Botafogo de Garrincha? Entre outras tantas.
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Usando novamente o exemplo do RSP: Um torneio de pontos corridos, de dois grupos (talvez homenageando os dois maiores jogadores de sempre: Grupo Pelé e Grupo Garrincha, marketing, marketing... este é o futuro do futebol) contando, cada grupo com dois times do Rio de Janeiro e dois de São Paulo, utilizando o modelo do Cariocão: na primeira fase os times jogam entre si do mesmo grupo, no returno contra os adversários do outro grupo. Os 2 melhores de cada grupo vão para um quadrangular final, todos contra todos, em jogo único, com mando de campo para aquele melhor qualificado na fase de grupos. Os dois melhores farão uma final de dois jogos, com a preferência do último jogo em casa para o que tivesse o melhor desempenho no quadrangular final.
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Tiro curto (os times jogariam no mínimo 7 jogos na fase de grupos, mais 3 do quadrangular, e mais 2 jogos finais), só timaços, grandes públicos, e ainda podendo ter as paradas estratégicas no entre-fases (entre o turno e o returno) para as finais estaduais – podendo ocorrer os mata-matas de um possível segundo turno, justamente após as finais das ligas regionais, tudo bem sincronizado, o que poderia apimentar ainda mais as finais tanto estaduais quanto regionais, com um sentimento de revanche, imagine um Palmeiras e Coríntias num quadrangular regional após um ter eliminado o outro das finais estaduiais, ou um Fla-Flu na final de um Cariocão depois de uma final destas num RSP! O sonho de muito dirigente com problemas de cofres, e o jogo do ano para muitos torcedores – seriam jogos para serem lembrados por décadas! –.
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A mesmíssima fórmula poderia ser aplicado à Copa Sul-Minas (CSM). Com os dois gigantes de Minas (Cruzeiro e Atlético-MG), os dois imensos gaúchos (Internacional e Grêmio) e os dois campeões brasileiros do Paraná (Coritiba e Atlético-PR), mais dois ou quatro convidados (dependendo do desempenho destes times no ano anterior, hoje, por exemplo, com certeza eu chamaria o Avaí para constar nesta lista, afinal é time de primeira divisão, e o Figueirense, que há alguns anos vem sendo bastante competitivo).
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Obviamente eu não aplicaria a mesma fórmula ao CNE, ou as Copas do Norte e do Centro-Oeste. Embora alguns clubes destas regiões joguem na primeira e na segunda divisões do CBR – e alguns deles enormes times no âmbito nacional, como os grandes baianos e pernambucanos –, há uma necessidade de um torneio maior, com mais times e mais longos, assim como campeonatos estaduais diferenciados para estas regiões, mais compridos. Assim, ocupando o 1º semestre com o Estadual e o 2º com o Regional, desta forma, os times teriam mais caixa, e o futebol longe dos grandes centros econômicos – não se engane, o futebol do Sul e, principalmente, do Sudeste é melhor porque têm mais dinheiro, só por isso, não há nada na água destes estados que façam as pessoas jogarem mais bola que nos outros lugares do mundo – estaria mais valorizado.
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Da mesma forma, os pequenos times do Rio de Janeiro, de São Paulo, de Minas Gerais, do Rio Grande do Sul e do Paraná, poderiam competir entre si em ligas regionais compatíveis com o seu tamanho, uma copa para o Sudeste e outra para o Sul, nos moldes do CNE. Fazendo com que estes times utilizem profissionais do futebol o ano todo, e, como todos sabemos, o futebol é a saída da miséria de muitas famílias no Brasil – o que esquecemos é que a maioria absoluta dos jogadores profissionais do futebol ganham em torno de 2 a 3 salários mínimos, mas é um dinheiro que sustenta uma família nos lugares mais pobres do país –.
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Reagrupando o futebol no nível local, começaria também a repensá-lo no nível nacional. A primeira mudança seria na Copa do Brasil (CB), e seria simples: ao invés dela acontecer concomitante à Copa Libertadores da América (CL), eu a puxaria para ocorrer entre a CL e a Copa Sulamericana (CS), isso mesmo, no meio do ano. Como torneio mata-mata, não interferiria muito no andamento do CBR, assim como a CS não mexe muito no nosso calendário, pois os times vão caindo, e a maioria encontra-se fora deste torneio.
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A CB é o único torneio do mundo que eu conheço que o campeão não pode defender o seu título, isto é, nunca haverá um bicampeão de fato – a Copa do Mundo passou a ter critério de não mais classificar de forma direta um campeão o seu campeão para o torneio seguinte, mas nas duas copas posteriores a esse regulamento, 2006 e 2010, os campeões anteriores estavam lá, defendendo o seu título, o que só não ocorreu, salvo engano na Copa de 1934 em que os Uruguaios se recusaram a participar em represália ao grande número de desistências dos Europeus em sua casa –, e esta simples mudança da data possibilitaria este feito, e ainda a valorizaria, pois, hoje em dia, a CB é o torneio para quem não teve competência de ir para à CL.
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Até mesmo o sistema italiano pode ser utilizado para melhorar o encaixe entre a CB e a CL, isto é, os times mais avançados no torneio continental, entram mais tarde na Copa Nacional. Algo para mim completamente legítimo, a Internationale de Milão de Mourinho, foi campeã da Copa da Itália disputando apenas 5 jogos, enquanto times menores jogaram muito mais e nem chegaram perto da final.
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Tradução: mais jogos, mais finais, mais caixa. Mais rentável para os clubes, mais rentável, principalmente, para as federações esportivas. Um time grande, desta forma, disputaria até 5 títulos por ano, sendo 2 regionais (estadual e interestadual), 2 nacionais (CB e CBR) e 1 internacional (CL ou CS). Com o ano cheio, e mais renda, os clubes seriam obrigados a reforçar o elenco por causa do grande número de jogos, o que abriria mais portas para os profissionais da bola, e fortaleceria os clubes com melhores estruturas, principalmente no que tange às categorias de base: com recursos limitados, seria de lá que sairia a maioria dos jogadores que comporiam elenco para tantos torneios disputados, e a venda destes jogadores que se destacam aumentaria o fluxo de caixa das equipes formadoras.
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Por fim o mais importante título nacional, o campeonato brasileiro. Um cocunhado meu me sugeriu um CBR de 25 a 31 times de turno único – o número ímpar de participantes seria necessário para que os times tenham a mesma quantidade jogos em casa e fora –. Mas eu não mudaria em nada a 1º e 2º divisões nacionais, que para mim já são sucessos.
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Minhas mudanças começariam com a extinção da 4º divisão, seguida de uma reformulação da terceirona: Quatro grupos de 9 times cada, jogando ida e volta, passando os dois melhores de cada grupo para as quartas-de-final, os semifinalistas teriam acesso direto à segunda divisão. Campeonato longo o suficiente para ocupar todo um semestre, com todos os times jogando pelo menos 16 jogos, com o finalista chegando a 22 jogos, principalmente se levarmos em conta que um turno da primeira ou da 2º divisão tem 18 jogos.
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A questão ficaria de como selecionar os 36 times da disputa. Primeiro, os 4 rebaixados da 2º divisão, que ficariam como cabeças de chave. Depois, distribui-se 1 campeão de cada uma das 5 ligas regionais – ou melhores colocados nestes torneios que não jogue nem a primeira nem a segunda divisões – por cada um dos 4 grupos, ficando um grupo com dois campeões de ligas; e, por fim, distribui-se os 27 campeões estaduais – ou melhores colocados nestes torneios que não jogue nem a primeira nem a segunda divisões, e nem sejam campeões regionais –.
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Essa estrutura aumentaria a importância das ligas regionais, mormente aquelas “Ligas B” com os times pequenos do RSP e da CSM, e os estaduais dos estados mais pobres. O chaveamento seguiria mais ou menos o esquema abaixo – eu tentaria formar grupos com times de estados próximos, para que gastem menos em viagens, mas esta medida poderia transformar a primeira fase da 3º divisão do CBR numa nova Liga regional –:
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GRUPO I = R1, L1, L5, E1, E5, E9, E13, E17, E21
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GRUPO II = R2, L2, E2, E6, E10, E14, E18, E22, E25
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GRUPO III = R3, L3, E3, E7, E11, E15, E19, E23, E26
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GRUPO IV = R4, L4, E4, E8, E12, E16, E20, E24, E27
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LEGENDA:
E (campeão estadual)
R (rebaixados da segunda divisão do ano anterior)
L (campeão das ligas regionais)
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Eis as minhas sugestões: fortalecer os estaduais, colocando os grandes times para jogarem apenas jogos importantes. Ressuscitar os grandes torneios regionais. Dar oportunidade e calendário para os times pequenos dos grandes centros (Rio, São Paulo, Minas, Rio Grande do Sul e Paraná) e para o futebol dos estados mais pobres: com seus estaduais mais fortes, suas ligas regionais com visibilidade e uma terceira divisão que se torna o sonho destes times que competem nestes campeonatos – hoje, os campeões estaduais têm acesso à quarta divisão, o que os coloca muito longe da elite do futebol –. Calendário organizado gera recursos para os clubes e oportunidades para os jovens jogadores, e os mais velhos que estão se preparando para deixar o futebol e organizando seus “pés-de-meia” para suas aposentadorias.