segunda-feira, 30 de abril de 2012

GENERAIS E TÉCNICOS: AÇÕES RELÂMPAGOS, AÇÕES CURTAS


No inicio da Segunda Guerra Mundial, a vanguarda do exército alemão fez estragos enormes na defesa francesa. Os franceses criaram o que seria a maior defesa terrestre da humanidade desde a construção da Grande Muralha da China: a Linha Maginot.
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Os generais franceses – e poloneses, e russos, e austríacos – estavam acostumados com outro tipo de guerra, uma guerra ainda descendente da era napoleônica: lutas diretas, com soldados e infantarias, cavalarias em descidas, e, sobretudo, bombardeios de artilharia pesada (canhões).
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Nem mesmo a Primeira Grande Guerra, que modificou completamente a NATUREZA de luta – ao invés de batalhas campais, a guerra passou a ser “de trincheira” – modificou tanto a ESTRATÉGIA de luta.
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Os estrategistas alemães sugeriram a Hitler uma estratégia completamente nova, e inclusive considerada covarde: a blitzkrieg – o ataque relâmpago –. Os próprios generais de carreira alemães torceram o nariz para o novo modo de lutar que não estava nos manuais. Mas Hitler comprou a ideia, e que ideia.
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Sem preparações, sem posicionamento em campo, sem uma leitura específica entre peças. Os tanques: eles vinham, abriam o caminho, destruíam e não ocupavam, íam embora e deixavam os inimigos atônitos, o ataque terminava antes que a resposta tivesse sido dada.
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No futebol, vejamos, a título de exemplo, a tática utilizada pelo Real Madrid de Jose Mourinho em diversas partidas contra o Barcelona de Josep Guardiola: um inicio avassalador, com pressão nos zagueiros e no goleiro o que permitiu vários gols nos primeiros minutos – e até nos primeiros segundos – de jogo a favor dos galácticos.
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Também está sendo a tática empregada por Arsene Wenger no momento em que conseguiu estruturar o seu Arsenal – já no mês de fevereiro deste ano, com mais de 6 meses de campeonato rolando –, sobretudo iniciando por colocar Rosicky como ponta-de-lança do triângulo médio dos gunners.
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Podemos dividir, deste modo, os jogos do Arsenal em 6 momentos chaves, divididos igualmente – ou quase – em 15 minutos. Nos primeiros 15 o time pressiona tanto que fica difícil determinar uma posição tática para os jogadores (contudo nós já sabemos de antemão do posicionamento NORMAL deles na maioria dos jogos). Depois disso, o time passa 15 minutos de descanso, quando o adversário costuma equilibrar a disputa da partida (usualmente, a posse de bola do Arsenal nestes primeiros minutos ultrapassa os 65%), voltando a pressionar, novamente nos últimos 15 minutos. No inicio do segundo tempo, a proposta é a mesma, mas menos intensa: primeiro terço com “blitz”, segundo de repouso e terceiro com nova investida, esta tão forte (ou quase tanto) quanto os 15 minutos avassaladores iniciais. O resultado é que em quase todas as partidas o Arsenal marca um gol nos primeiros 15 a vinte minutos da partida (e nessa estatística eu incluo, na conta, a vitória em cima do Manchester City, em torno dos 10 minutos: num escanteio, van Persie cabeceia para o gol que foi salvo pelo seu companheiro de time Vermaelen), e em outros tantos marcou gols nos últimos 5 minutos da contenda, ou até mesmo no tempo extra!
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Conjugar um início avassalador, veloz, de pressão alta, tomando controle total da posse de bola, mas ao mesmo tempo um controle curto, passando para um modo de espera e manutenção física, é a característica principal desta estratégia, que começou com os novos estrategistas de Hitler, mas que teve auge justamente com a seleção da Hungria 1952-4.
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Os magiares costumavam fazer pelo menos 2 gols antes dos primeiros 10 minutos de jogo, se utilizando dessa estratégia aliada a um preparo físico e de um aquecimento inédito para os profissionais da época, mas que não era estranho para atletas militares.

terça-feira, 24 de abril de 2012

A MÁXIMA VITÓRIA DO FUTEBOL


E o futebol venceu.

Venceu como deveria ter vencido, como um herói que é.

É de nossa natureza, traumática e fraca, querer torcer pelo vira-lata – menos quando somos os torcedores do time, é claro, todos querem seus times imbatíveis –.

Ao que me consta, pobremente, só dois times foram invencíveis. A Seleção brasileira com Pelé-Garrincha, e a Seleção brasileira de 69 e 70. O resto, todos perderam uma hora ou outra.

Agourento, o grande e genial Jonathan Wilson já previra, no início da temporada, mesmo à despeito da genialidade tática e estratégica de Josep Guardiola, a queda do Barcelona, por causa da “maldição dos três anos”, isto é, NENHUM time resiste a três anos, ele se desmancha. As alternativas são simples, ou se muda o técnico e preservam-se os jogadores, ou mudam-se os jogadores e preserva-se o técnico. Ora, o Barcelona optou pela primeira opção. Do time de Frank Rjikard, bicampeão de La Liga e ganhador da UCL, o time está quase todo ali, o mesmo. Messi era titular naquele time, Xavi (ainda visto como primeiro volante apenas) e Iniesta eram reservas de luxo. O capitão já era Puyol, Valdés comia de vez em quando os seus galináceos e outras vezes fazia defesas quase estupendas. O Arsenal e o Manchester United optaram pelo segundo, mantém o técnico – e com ele os seus homens de segurança, o que seria de Sir Fergusson sem seu Giggs, por lá a quase tanto tempo quanto o professor escocês –, roda o elenco, para que em 4 anos, o time seja praticamente outro.

Não é o fim de uma filosofia, mas o é de uma era! Não acho que o Guardiola fique. E sem ele vai-se a Magia. É certo que o time continua sendo excepcional, como era maravilhoso o time de Rjikard, mas o time do holandês, mesmo na fase em que chegavam a comparar Ronaldo Assis com Pelé, não é do mesmo nível que ESTE Barcelona. Eu sempre fui categórico: Nem o Barcelona joga igual ao Barcelona O que Pep cunhou nos corações e almas dos amantes de futebol foi outro nível, algo que não se via, há pelo menos 3 décadas – o próprio Barcelona do qual fez parte e foi campeão da Champions, ou até mesmo o grande Milan de Arrigo Sacchi –, ou até mesmo 4 décadas – o Flamengo de Zico –.

É, acima de tudo, o fim porque a fórmula se foi. E hoje (24/04/2012) foi a prova cabal. A estratégia de Guardiola sempre foi clara: em seus 4-3-3 com Eto’o no centro do ataque, Henry na ponta direita e Messi na ponta esquerda. Ora, Henry e Messi entravam na área o tempo todo. Mas o pulo do gato foi quando Pep resgatou o falso 9 de Puskás. Messi foi pro centro, Eto’o pra direita.

Guardiola trouxe Ibrahimovic para que o time tivesse força de área (e aérea). Mas não deu certo. Perdeu-se a UCL. Pedrito apareceu, bancou-se Ibra. Atacantes continuavam entrando, Messi fazia o vai-e-volta no centro do ataque, ora o time era um 4-3-3, ora um 4-3-1-2, e a defesa ficava zonza.

Henry foi embora, veio David Villa. O sistema ficou ainda mais perfeito, mais sincronizado. Messi saia, entravam Villa, Pedrito (que já virava Pedro) e Iniesta dentro da área. Messi e Xavi davam passes açucarados. Messi chutava de fora da área indefensáveis mísseis teleguiados.

Villa quebrou a perna, trouxeram Alex Sanchez e Fábregas (para substituir o envelhecido Xavi, que não joga mais como antes). E chegou-se ao fim. Ao mesmo tempo que louvávamos o fato do Barcelona jogar com 8, 9 ou até 10 jogadores da base (dependendo se jogam os laterais brasileiros, ou Abdal, ou Alex Sanchez), nós víamos que a qualidade caía.

A teoria era simples: Villa na direita, Messi no centro e Alex na esquerda. Alex joga melhor no centro, é 9 de verdade, mas fazia muito bem a função. Villa não se recuperou, e não se sabe se continuará no time. Sanchez não está 100%.

E chegamos finalmente a hoje. Nesta semifinal, o Barça (no 3-1-3-3, chegando ao ápice de 3-3-4), jogava com 4 homens à frente de Messi, mas sem infiltradores. Fábregas na direita (depois Keitá no centro), Sanchez e Iniesta no centro, Cuenca (depois Tello) na esquerda. Depois Iniesta veio pro meio campo e Dani Alves ficou aberto na direita.

E quem infiltrava? Ninguém. Ora, a entrada de Keitá – volante – deveu-se justamente ao fato do time catalão só jogar com chuveirinhos, e, no banco, o gênio Guardiola não tinha nenhum centro-avante grandalhão que entrasse e tivesse presença de área (como Mário Gómez no Bayern de Munique).

E isso ocorreu porque o Chelsea novamente cedeu um campo estreito pro Barcelona jogar e travou completamente a entrada da área. Neste contexto, os blues aproveitaram-se do fato do Barça ter totalmente o centro e, desta forma, instintivamente, flanqueava-se a si mesmo. Assim, acelerando pelos cantos, com Ramires e Torres (e antes dele Drogba), os londrinos marcaram os gols em contra-ataques lateralizados, aproveitando-se desse natural afunilamento do time blaugrana.

(Muitos falaram da tática de Di Matteo lembrar justamente o de Mourinho com a Internationale, inclusive, com 1 a menos, ter colocado o centro-avante de lateral esquerdo, utilizando as costas de Dani Alves pro ataque lateral. Mas vale lembrar que a tática de Guardiola foi a mesma. Na falta de centro-avante, ele usou, antes, Pique de 9, e hoje foi Keitá)

Era a diferença que fazia o lesionado David Villa, a infiltração. TODO MUNDO está dando as pontas pro Barça, e fechando com 2 volantes à frente da grande área. O falso 9 de Messi acabou se tornando inútil, El Pulga tem agora que passar por 4 ou 5 defensores, ao mesmo tempo que ninguém entra dentro da área pra matar as jogadas.

A grande jogada de Messi, durante todo o jogo, foi justamente como um 10 clássico, encontrando um infiltrador pela esquerda, no caso o Iniesta, e dando o passe perfeito pra este finalizar. Ressaltemos também a inteligência do 8 para esperar o momento certo e impedir de entrar em impedimento.

Da mesma forma, louvar Ramires por seu golaço. O difícil no seu gol não foi a conclusão – treinável –, mas justamente a desaceleração: ao dar a bola a Lampard e correr pra receber na frente, o 7 azul simplesmente para a corrida a um passo da grande área, para poder visualizar completamente a jogada. Reitero, o mais difícil e incrível da jogada foi não se empolgar de vez e tentar uma bobagem, mas manter a calma, desacelerar e finalizar com qualidade em frente ao goleiro.

De modo contrário, abrir o olho para o grande carrasco catalão, Fernando Torres. Com este tento, soma 8 golos em cima do time azulgrená. Sozinho contra Valdés deveria, mas o drible que El Niño deu sobre o goleiro barcelonista foi muito errado, a quase três metros de distância, se Valdés fosse outro teria ficado de pé e dado o bote nas pernas de Torres. Mas o goleiro blaugrana é assim, quase leva um gol de Drogba de antes de linha de meio, e cai antes do drible. Talvez, aos olhos de Abramovic, este gol tenha valido os £50 mi investidos e que não deram fruto, principalmente se o Chelsea for campeão lá em Maio.

Faltam PEÇAS ao Barça, faltam mesmo, o time não tem banco a altura. A grande geração está aí, acabando. Xavi (envelhecido) e não dando mais conta do recado como antes, Fábregas (que veio pra substituí-lo), Iniesta e Messi são realmente acima da média, mas se um deles está mal (como Xavi nos últimos jogos, e Fábregas consigo), quem entra pra mudar alguma coisa? Tello, Cuenca? Quem pode ainda dar um caldo é o Thiago. La Mazia está na entresafra, esses garotos vão dar frutos assim como Pedro deu, Pedro que não é nenhum grande jogador, mas que tem qualidade para ajudar a formar um grande time.

Mas quando se chega na fase em que o jogador que fez gols em todos os títulos de 2010, de um time que ganhou tudo possível – inclusive a copa do mundo – e ele acaba por se tornar banco para Tello, que é, por sua vez, reserva de Cuenca, vê-se aí o ponto nevrálgico do problema.

O Barça vai se reerguer, com certeza. La Mazia continuará a produzir grandes jogadores e alguns craques. E provavelmente terão uma geração quase tão boa quanto esta. Mas o ciclo vem em declínio.

Resta saber, então, se Guardiola irá conduzir esta renovação, ou se a renovação se dará em outro sentido, com outro treinador, não tão comprometido filosoficamente com a escola de Cruyff.

Mas enquanto isso, só o futebol vence, quando mantém essa aura de imprevisibilidade. Esporte cujas regras permitem que um time fique o tempo inteiro se defendendo (no vôlei isso é proibido, no basquete, no futebol americano, no beisebol etc.) e que criou uma peça assaz interessante: o goleiro. Não importando a disparidade entre os times, um goleiro em noite inspirada (como foi Cech no jogo de ida) pode mudar completamente o resultado de uma partida. Por isso se diz (embora seja uma meia-verdade) que só neste esporte é possível que o mais fraco vença o mais forte (o que também  não é um acontecimento comum).

DE MÁMORE E MARFIM


basta de bostas!
             gritam nas ruas
                          o povo marchando
             enquanto isso
                          em Brasília
             segue qoroada
                          de mármore
                                            e marfim.

segunda-feira, 23 de abril de 2012

GENERAIS E TÉCNICOS: CENTRO FRACO, FLANCO RÁPIDO, OS ALEXANDRES DO FUTEBOL

Encontrava-se Alexandre Magno, da Macedônia, com seu ínfimo exército diante de Dario, senhor da Pérsia, este ladeado por incontáveis batalhões. Alexandre que nunca perderia uma única batalha. O resultado era óbvio: Alexandre não poderia, a exemplo de Leônidas, usar o terreno para afunilar os orientais, anulando, deste modo, a sua superioridade numérica. Todavia, acredito eu que estratégia foi inventada para que o mais fraco vença!
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O que Alexandre faz? Uma loucura tática. Diminui as sua falanges e as estende pelo campo aberto. Visualmente o exército helênico pareceria maior, mais vasto. Era um apelo psicológico, mas de nenhuma outra grande utilidade prática, como todos os seus generais sabiam que não funcionaria - se o plano de Alexandre fosse botar Dario pra correr por ver um exército grande, não daria certo -.
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Enfraquecendo o seu centro, Alexandre deslocou a cavalaria para o flanco oposto donde normalmente a prática bélica mandava. O início do combate foi um massacre. As forças de Dario empurravam os poucos homens gregos e macedônios para trás. Quanto mais batiam, mais os persas, encontrando facilidade, centralizavam. Naturalmente a linha helênica tomava a forma de um V. O movimento acentuou-se tanto que, em determinado momento, os homens de Alexandre já flanqueavam os homens de Dario.
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Era o que Alexandre desejava. Numa única ordem, a cavalaria grega, já em posição privilegiada, desistiu do combate direto à cavalaria persa e acelerou sobre as costas do grosso do exército, que já se via completamente flanqueado pelo inimigo, e agora, com a carga macedônica nas costas: não tinham mais o que fazer. A derrota foi tão acachapante que Dario foi obrigado a fugir, deixando a Babilônia aberta para Alexandre, na maior vitória da História ocidental.
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Onde entra isso no futebol? Ora, é uma tática extremamente comum, sobretudo nos fins dos anos 80 até início dos anos 90, no reino do 3-5-2 (3-4-1-2). E isso vem de muito tempo atrás, também. No catenaccio interista de Heleno Herrera a tática era idêntica. A partir da base do WM (3-2-2-3) o time italiano bicampeão da Copa dos Campeões recuava um de seus volantes para a linha de zaga, trabalhando de sobra, formando, assim, um protótipo de 4-3-3 (4-1-2-3).
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Ora, o que Heleno pretendia? Enfraquecendo o seu centro - um volante contra dois meias -, forçava os adversários a trabalhar por aquela zona. Com a bola roubada, o jogo era aberto aos velocistas das pontas, que destruíam os adversário em contra-ataques velocíssimos.
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Não se pode, porém, confundir essa estratégia com aquela usada por Joel Santana durante alguns anos entre o título da Mercosul com o Vasco e a sua saída do Botafogo em 2011. Isto é, enfraquecer o seu centro e sair a partir de chutões pra frente. O chamado muricybol. A ideia é o oposto: 1º ceder o centro, fazer com que o adversário fique estreito, tentando entrar pelo meio, trabalhar a bola por lá. Não é só entregar o protagonismo, pelo contrário, é forçar o adversário a um determinado movimento que lhe interessa. 2º Acelerar os movimentos lateralizados, pegando o adversário "pelas costas". Este movimento só é possível porque o outro time flanqueia-se a si mesmo.
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P.S.: Este texto estava pronto desde quinta-feira. No sábado tivemos o El Clásico (Barcelona x Real Madrid). Notem que a tática de José Mourinho foi justamente esta. Antes do primeiro gol o time estava bem quebrado - o que é bem anti-Mourinho, que sempre gostou de times compactos -, o quarteto ofensivo dava pressão alta sobre os defensores, mas os outros 6 jogadores ficavam sentados em frente à zaga. O resultado é que o Barcelona teve todo o meio-campo (foram 72% de posse ao fim do jogo). Mourinho deixava os velocistas livres pelos lados, eram 4 contra os 3 zagueiros - já que, no WM blaugrana Sérgio Busquets fazia o movimento de ser volante com a bola e zagueiro sem a mesma -. Os gols do Real saíram todos de jogadas deste tipo, tanto o primeiro advindo de um escanteio, conseguido numa aceleração lateral, e, sobretudo o 2º tento, com Özil aberto na direita recebeu o passe do contra-ataque e abriu para Ronaldo que cruzava o campo, em velocidade, da esquerda para a direita, matando o jogo.
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Próxima segunda-feita cometerei um ato capital: Como Hitler entra no futebol - e não, não é nos discursos racistas que vêm encontrando vozes no Velho Continente -.

quinta-feira, 19 de abril de 2012

GENERAIS E TÉCNICOS: TERMÓPILAS LONDRINAS


Há algum tempo venho pensando em escrever sobre estratégias de guerra que entraram para História, mas aplicadas à tática do futebol, isto é, como os técnicos utilizam, conscientemente ou não, estas estratégias vitoriosas nos seus planos de jogo.
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O jogo de ontem (18/04/2012) de Chelsea Vs Barcelona fez-me voltar ao tema. Ora, vamos ao General Histórico: Tendo o Peloponeso sendo atacado pela maior horda de soldados que o mundo já vira até então (o exército de Xerxes, senhor da Pérsia), Leônidas, um dos três reis de Esparta (capital do Peloponeso), promove um estratagema suicida: levar sua guarda pessoal de 300 guerreiros de elite, liderando um total de 3000 soldados para o estreito desfiladeiro das Termópilas (“passagens quentes”), onde o grande número inimigo ficaria esmagado, na sua estreita estrada, entre os muros do penhasco e a queda direta ao mar revolto da Grécia.
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Devemos compreender a vitória de Leônidas como uma vitória moral e psicológica. Um contingente minúsculo parar o maior exército do planeta. O suficiente pra interromper a marcha de Xerxes – completamente desmoralizado – e, finalmente, unificar toda uma helenidade que, se unida pelos laços culturais e linguísticos, era totalmente fragmentada politicamente, tendo, cada Pólis, seu próprio basileu.
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Analogicamente, podemos ver no jogo de futebol uma situação idêntica. Ora, se pelas regras, não existe maior quantidade numérica de jogadores em time do que em outro, nós podemos nos deparar com uma diferença técnica e/ou física absurda. Um exemplo claro é qualquer equipe que enfrente o atual Barcelona.
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Lembremos, pois, a seleção francesa de 2006.  Para aproveitar ao máximo Zinedine Yazig Zidane, o 4-2-3-1 gaulês defendia em dois bancos de 4, mantendo Zizou e Henry pressionando na frente os zagueiros. Então, com 4 homens podemos defender muito bem, quando sentamos atrás, afinal teríamos um jogador à direita, outro ao centro e um terceiro à esquerda, mais um dobrando a marcação em cada uma dessas três zonas. No entanto, não era isso que o selecionado do Galo Azul fazia: Ao invés de se manterem “largos” (wide) eles se mantinham “estreitos” (narrow), como colocam os ingleses tão preocupados em jogar pelos lados do campo.
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Neste sentido, a estratégia era a mesma da de Leônidas: abrir um campo estreito para o adversário passar, onde sua “maioria” física seria inútil contra os velhinhos franceses. Tendo 8 homens à sua frente, o adversário central procuraria um jogador livre pela direita – por exemplo –, e a equipe azul descia em bloco em direção à bola, sem necessariamente dar combate direto – isto é, não faziam pressão alta sobre a bola, mas a perseguiam-na em bloco em pressão leve –; a saída do jogador na direita era simples, voltar para o centro. E de lápra esquerda, e da esquerda de volta para o centro, etc. etc. etc., sendo induzidos assim ao erro e entregando contra-ataques mortais aos velocíssimos wingers franceses – Assistam novamente ao jogo contra a Espanha, e revejam os golos de Zidane e Ribery nesta partida –.
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Ora, e não foi esta a estratégia do Chelsea, ontem contra o Barça? Um 4-3-3/4-5-1, com três volantes, tendo apenas Lampard como homem que sai – embora, no jogo em questão, ele nem saiu de trás, apenas para bater bolas paradas –. Bem aberto na esquerda estava Ramires na sua função de carrillero (o segundo volante lateral do 4-3-1-2 argentino) aberto, justamente pra bloquear as subidas de Dani Alves, e aproveitar, com sua velocidade e vigor – comparáveis ao próprio lateral blaugrana – as costas do brasileiro do time catalão. Na ponta-direita encontrava-se Mata. Mas Mata jogou praticamente centralizado, aumentando, assim, a quantidade de jogadores na região de posse de bola. Desta forma, Di Matteo fez uma aposta, apostou que o Barça jogaria com um ponta muito aberto na esquerda e com Puyol fazendo o jogo de Abidal – o lateral/terceiro zagueiro pela esquerda –. A sorte de Di Matteo foi que o Barça tinha um lateral apoiador na esquerda, Adriano, mas o ponta era Iniesta, que sempre centralizava naturalmente; Mata, desta forma, não precisaria marcar ninguém, deixando lateral contra lateral na direita do seu time.
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A superioridade técnica do Barcelona foi reduzida a um estreito caminho pela esquerda, com apenas um jogador sendo capaz de utilizar aquele setor eficientemente. No fim da partida, Guardiola tentou aproveitar-se desse corredor, colocando por ali Thiago Alcântara, mas já era tarde. Sendo pouco municiado, Messi foi obrigado a descer até onde não é efetivo, na frente dos volantes adversários, para buscar a bola. Numa dessas descidas, foi desarmado por um Lampard que não subia, que lançou um Ramires solto nas costas de um Dani Alves muito avançado, que correu e deixou Drogba em posição de finalização. Um chute de dentro da área e um gol. A eficiência é necessidade sine quae non para este tipo de estratégia.
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Devemos compreender a vitória de Leônidas, dum ponto de vista futebolístico, como uma vitória deste mesmo tipo. O time mais fraco que estrategicamente se segura e em uma bola faz o resultado. Ou leva o empate até os pênaltis, em que a habilidade individual fica reduzida ao instante da finalização, num embate mano-a-mano contra o goleiro.
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Se Di Matteo usou esta estratégia de forma consciente ou não, isso é irrelevante, como é irrelevante questionar se os traficantes que se utilizam das estreitas vielas das favelas para combater e fugir da polícia nos morros brasileiros conhecem estratégia militar e a História de Leônidas – ou se só assistiram ao filme de Zack Snyder baseado no romance gráfico de Frank Miller –. O fato é: o aproveitamento de uma estratégia antiga, do considerado o maior General da História ocidental, devidamente adaptando a sua filosofia ao “novo campo de guerra”, ainda funciona perfeitamente. Como no caso do rei espartano, esta estratégia necessita, acima de tudo, que os seus guerreiros/soldados/jogadores sejam extremamente disciplinados. No fim do jogo, a defesa dos blues relaxaram um pouco e só não devolveram o empate com gols aos catalães, se não fosse o chute absurdo de Sérgio Busquetes por cima do gol totalmente aberto dos ingleses.
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Na próxima segunda-feira voltaremos ao mesmo tema, investigando onde e como Alexandre, O Grande, da Macedônia está presente na mente tática dos treinadores de futebol.
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Para uma análise tática da partida e uma visualização de como o Chelsea abriu a direita para afunilar o Barcelona, leia aqui, no Zonal Marking

quarta-feira, 18 de abril de 2012

um pouquinho de iconoclastia!


Ó! mestre!
fazei com que eu procure mais
controlar que ser controlado
converter que ser convertido
odiar que ser odiado
pois é tomando que se acumula
e é matando que se vive
mais tempo nessa terra!