quinta-feira, 20 de novembro de 2014

QUANDO A SITUAÇÃO FICA PRETA

Quando a situação está ruim, ela está preta. Quando o cabelo é ruim, é porque ele é de preto. A lista das pessoas más? A lista negra. Qual é a cor da pele do teu amigo? Ele é moreninho. E do teu desafeto? Ele é tição.
Em torno de 60% da população nordestina é negra ou descendente de negros. Mas esta parcela da população não está representada nas cadeiras do curso de medicina, de direito, nas pós-graduações. Não é a porcentagem que vemos entre juízes, promotores, vereadores, generais, deputados, governadores, senadores, ministros. Presidente? Jamais.
Nas novelas da TV, salvo raríssimas exceções, gente preta é o empregado doméstico, o núcleo cômico. Protagonistas? Talvez uns cinco, menos de dez com certeza.
Onde se escondem os negros brasileiros?
Provavelmente, os negros brasileiros adoram ter empregos inferiores, não ocupar posições de mando, ganhar menos que os brancos pelas mesmas funções, ser sempre o feio, ser sempre motivo de piada, ser comparado com fezes, ser tratado e chamado de animal. A mulher negra ama ser estereotipo do objeto sexual do macho brasileiro, desde as redes dos sinhozinhos da Casa Grande, do mato do capataz até as “globelezas”, os “Sexo e as Negas”. 
E com certeza, quando um negro defende-se e devolve na mesma moeda – o que nunca é educado – uma expressão racista, tem que aguentar ser chamado de racista invertido: como se ter olho azul fosse feio por natureza, cabelo dourado e liso fosse motivo de piada: fuá, pixaim, cabelo duro.
        Não é a sua religião que é um antro de demônios.
Ter consciência negra não é particular do negro, nem uma reafirmação de humanidade, porque uns são mais gente do que outros, mas é tomar consciência de toda uma construção histórica e simbólica que escraviza e escravizou – hoje culturalmente, inferiorizando pelas estruturas de diferenciação –. 
         Falar que todos são iguais é uma violência, uns são mais iguais que outros. Falar que uma pessoa deva se fazer pelo próprio mérito é um absurdo num país em que um negro vindo de uma comunidade carente, descendente de séculos de empregadas domésticas e pedreiros, deva concorrer com um garoto branco filho de um juiz branco, de dez, doze gerações de doutores.
          Ter consciência negra é lembrar, é olhar, é pelejar pelo futuro. Porque, ainda hoje, a situação não está nada branca para quem tem melanina a mais do que o “normal” na pele.

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